O amor está no ar: a mídia e a produção de um jeito de amar
Durante certo tempo, a literatura funcionou
como um modo de educação sentimental
produzindo uma subjetividade masculina e feminina. Entretanto, tal ação passou
a ser de responsabilidade da mídia, o que nos faz pensar em seu estatuto
pedagógico. Para nós, a subjetividade constitui-se como um processo de
construção dos modos de pensar e agir de um sujeito, consciente e
inconscientemente, produzido também socialmente. Relaciona-se com o modo de
percepção da realidade circundante, por parte dos sujeitos e refere-se a um
processo de construção psicossocial capaz de produzir “mundos” e construir a
realidade a partir da interação do sujeito com o contexto que o circunda. Em um
mundo interpretado pelas instâncias comunicacionais, as mídias desempenham um
importante papel no processo de construção da subjetividade, uma vez que
constroem comportamentos, padronizam modelos e definem estilos, além de
estabelecerem um processo de interlocução com os sujeitos por elas atingidos.
Todos os fenômenos importantes da atualidade envolvem dimensões do desejo
e da subjetividade, pois as relações que os humanos estabelecem nas práticas
sociais são, em um certo sentido, fenômenos de subjetivação. Para a
psicanálise, a subjetividade é produzida pela linguagem, a partir de uma
circulação no social, sendo vivenciada pelos sujeitos em suas existências
particulares. Por esse caminho, a subjetividade é produzida por agenciamentos
de enunciação não centrados em agentes individuais nem grupais, mas são
duplamente descentrados, uma vez que implicam o funcionamento de estruturas de
expressão que podem extrapolar o sujeito. Com diversas instâncias
responsáveis pela produção da subjetividade, a mídia aparece como um modo
privilegiado de configuração do espaço público e construção de um modo de
amar.
Sendo uma característica do tempo presente, o
discurso amoroso apresenta-se como
uma forma de subjetivação construída pelas instâncias midiáticas através de
práticas discursivas e refere-se, a nosso ver, a um modo de apreensão na
atualidade que se manifesta de forma mediada pelo consumo. Melhor explicando:
de certo modo, o amor foi rebaixado à categoria de mercadoria, facilmente
acessado nas prateleiras, sobretudo das farmácias, quando há uma substituição
dos “labirintos da pulsão” pela venda em larga escala de Viagra e Ciallis, dois
medicamentos para aumentar a potência sexual masculina, o que faz com que a
ereção suplante a excitação. Sob o imperativo do gozo físico, o amor
transforma-se assim em uma performance sexual exaltada pelos diversos modos de
produção midiáticos. Construído de forma estereotipada, o amor preconizado por esses veículos de comunicação revela-se um
poderoso instrumento de vendagem e comercialização de produtos, além da
possibilidade de construção de modelos comportamentais.
Para a psicanálise, o sujeito pode
conformar-se a uma representação social pelas vias da identificação ao amor construído em uma dada época (e
nesses casos, sustenta ela, os ficcionistas desempenham o papel de produzir
certos efeitos emocionais em seus leitores), repetindo os modos e maneiras
circulantes em uma certa sociedade, assumindo um certo modo de subjetivação,
ou, de modo contrário, rebelando-se contra as formas padronizadas, o que nem
sempre acontece.
Por um lado, a clínica psicanalítica,
inaugurada a partir do amor, dá
testemunho das vicissitudes amorosas pelas quais os sujeitos da atualidade se
enveredam; por outro, a mídia, de modo geral, divulga o amor como uma forma de
venda de produtos e de aumento de audiência. Se o amor pode ser denominado, é possível dizer que são vários seus
nomes. E eles aparecem de formas várias, tais como Ausência, Sexo, Paixão, Signos, Anulação,
dentre tantos, conforme Roland Barthes nos ensina, ou seja, o discurso amoroso configura-se, à primeira vista,
como o Discurso Mestre na
contemporaneidade, sobretudo aquele baseado na dimensão do sexo.
O amor veiculado pelas mídias nos nossos dias, quando não se baseia
no “amor-gozo sexual” pode também apresentar a felicidade como algo possível de
ser alcançado pelas vias do amor
romântico, no qual só é possível ser feliz vivendo um “grande amor”. Os dois polos
são preconizados e transformados em modelos de comportamento, ainda que isso
possa parecer paradoxal.
Para saber mais:
https://freudcontemporaneo.webnode.com/l/amor-em-tempos-de-guerra2/https://freudcontemporaneo.webnode.com/l/amor-em-tempos-de-guerra2/
https://freudcontemporaneo.webnode.com/l/amor-em-tempos-de-guerra2/https://freudcontemporaneo.webnode.com/l/amor-em-tempos-de-guerra2/

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