Família, Psicanálise e Sociedade - “a loucura começa na família”
A frase que serve de título desta postagem fora enunciada por um usuário do serviço de saúde mental e, de certo modo, traz alguma verdade. É na trama familiar que há a irrupção da loucura. A clivagem psíquica da qual o sujeito é
acometido surge em decorrência da metáfora paterna, pelo processo de forclusão do Nome-do-Pai, o que impede a possibilidade de acesso do sujeito ao simbólico. A forclusão do Nome-do-Pai
“neutraliza o advento do recalque imaginário, provoca (...) o fracasso da metáfora paterna, e
compromete gravemente para a criança o acesso ao simbólico, barrando-lhe mesmo esta
possibilidade”.
Não havendo um corte na relação dual imaginária da criança
com sua mãe, não há possibilidade de circulação da Palavra do Pai e ao lugar que esta,
enquanto autoridade, ocupa na promoção da Lei.
Eis o louco! Aquele que não foi castrado. Aquele que negou radicalmente a castração do Outro.
“Forcluiu”, por sua vez, o Nome-do-Pai não restando qualquer traço ou vestígio dessa negação.
Entretanto, nesta estrutura – psicose – aquilo que foi negado no simbólico retorna do Real sob a
forma de automatismo mental, tendo como expressão principal a alucinação.
O Nome-do-Pai, juntamente com o Desejo da Mãe e os objetos é que constituem, para a
psicanálise, a família. Esta não tem origem no casamento e não é formada pelas relações de
consanguinidade, mas antes pelo romance familiar instaurado a partir da tríade edipiana.
Em Freud todo ser humano deve sua origem a um pai e a uma mãe, não tendo como escapar
dessa triangulação que constitui o cerne do conflito humano. Tal triangulação incide por toda a
existência do sujeito, sendo uma história – de amor por excelência – que definirá a estrutura
psíquica do sujeito e o seu acesso ou não ao simbólico. Esta trama edípica se finda motivada
pela ameaça de castração, onde o menino renuncia os desejos genitais-incestuosos pela mãe.
Ao mesmo tempo, há um abandono de sentimentos hostis contra o Pai-rival e a criança
identifica-se com o mesmo e entra no período de latência. Ao ver-se sob a ameaça de perder o seu pênis o menino abre mãe da satisfação incestuosa com a finalidade de preservar o seu
bem-amado órgão:
“Se a satisfação de amor no campo do complexo de Édipo deve custar à
criança o pênis, está fadado a surgir um conflito entre seu interesse narcísico
nesta parte de seu corpo e a catexia libidinal de seus objetos parentais. Nesse
conflito, triunfa normalmente a primeira dessas formas: o ego da criança volta
as costas ao complexo de Édipo” (FREUD, 1990).
Desse modo, a psicose surge da não-aceitação da castração, como já dito, da forclusion do
Nome-do-Pai. Algo no drama familiar falha impedindo que a castração se instaure, havendo,
dessa forma, a recusa desta castração. Todavia, essa castração do sujeito pode acontecer de
forma fragilizada, promovendo a formação de um Superego enfraquecido e de uma amarração
bamba em torno do Nome-do-Pai.
Na próxima postagem, discutiremos como as novas configurações familiares se articulam com aquilo que denominamos de sociedade.
Para saber mais: https://freudcontemporaneo.webnode.com/sociedade/
Cássio Eduardo Soares Miranda - Psicanalista

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